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01/11/14

A BIGORNA E A LIMA

António Mesquita

Manuel Fernandes Tomás


"(Fernandes Tomás) Admirador da Constituição da Bolívia, desejava que o "sistema todo fosse ao fogo, à bigorna e à lima", mas não de uma só vez, e sempre com as "compensações e contemplações que é preciso ter com os direitos adquiridos".

História de Portugal (Rui Ramos & al.)

A 'burguesia', apesar de viver de persuadir os outros (Alain), como acontece no comércio, não enjeita, na política, algumas ideias 'operárias' como esta de tratar o sistema como o ferro que vai ao fogo, à bigorna e à lima.

No século XIX, não havia ainda a cultura única dos 'media'. Nunca se poderia vender a ideia do bem comum, fora dos limites da religião, porque até Marx, o evangelista de GFW Hegel (mas de cabeça para baixo), as classes eram o 'horizonte inultrapassável' do tempo, expressão, como se sabe, utilizada por Sartre a propósito do marxismo.

Mas aqui temos um político português, que viveu até 1822 e que, portanto, não conheceu o Manifesto Comunista (1848), nem os seus autores, a empregar a palavra 'sistema', palavra que viria a ter naquele século e sobretudo no seguinte a fortuna que se conhece.

Que enorme avanço, de facto, substituir a sociedade 'natural', ainda ressonante dos ecos da Criação, por sistema, que é logo uma palavra que pressupõe que conhecemos ou podemos vir a conhecer e a controlar o dito sistema! Lembro-me, nos primeiros tempos do 25 de Abril, observar, nas pessoas menos politizadas, a rejeição das palavras novas como 'estrutura' ou 'sistema', precisamente. O sistema, realmente, já não pode ser obra de Deus, mas de cientistas ou de técnicos altamente qualificados (falava-se, significativamente, em tecnocracia).

A verdade é que por via de noções como essa e dos pressupostos conhecimentos que a sua compreensão implicava, a doutrina do mestre de Iena, mesmo travestida, dominou o século XX e permitiu-nos o invejado papel de sujeitos da História.

E perante as atribulações do presente é ainda essa doutrina que consola, dialecticamente, muitos de nós do fracasso dos nossos sonhos.

Mesmo metaforicamente, podemos imaginar a eficácia das modestas ferramentas de Passos Manuel para moldar o 'sistema'. Temo, porém, pela sorte dos direitos adquiridos, se dependerem da 'purificação' pelo fogo.

 

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