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01/09/16

NAUFRÁGIO


António Mesquita


"(...) era maravilhoso, esse homenzinho moreno de bigode encerado de alferes, quando falava em acordar com o apito das suas máquinas a vapor os touros alados do palácio de Sargon. Napoleónico ainda pela fé na sua estrela, por um optimismo comunicativo e pela profunda possessão desta ideia de que só se perde definitivamente uma questão quando se crê que está perdida."

"La vie en fleur" (Anatole France)

Porque, como sabemos, há causas que continuam vivas, apesar do resto do mundo ter deixado de acreditar nelas. Os impérios podem ruir, o Grande Corso podia ter sido já autopsiado na sua ilha que, por muito tempo, tudo isso, como os mortos que nos são mais próximos, continua de uma certa forma, a existir.

Nada parece mais contra-intuitivo que a ideia da ressurreição de um califado medieval em plena transformação tecnológica das sociedades. Porque é essa a novidade desta revolução que os hegelianos de esquerda e de direita não souberam antecipar: é que o 'global' está a derreter esses grandes 'icebergs' do passado que permitiram até agora o tempo e o espaço separados, a coexistência de mundos que eram fábula uns para os outros, graças à não-comunicação.

O discurso de Trump é o último assomo de um náufrago para se agarrar à jangada. Ele quer travar a força que tudo arrasta. E o perigo (tão natural é o seu esbracejar) são os que o candidato arrasta consigo.

Nenhum deles quer considerar que a sua causa está perdida.




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